Nas férias nada melhor do que contar histórias. No caso das
minhas, fatos que realmente aconteceram em aventuras nada normais.
Essa aventura aconteceu num domingo de maio do ano de 1998,
quando ainda morava em Mossoró e foi realizada de bike. Para variar, sem
companheiros tão malucos quanto eu. A aventura foi sair do bairro Costa e
Silva, mais especificamente dos Pintos, região do bairro onde morei, e ir até a
praia de Baixa Grande no município de Areia Branca, indo pela BR 110 até a estrada
que leva à praia. Até a estrada são cerca de 45 quilômetros seguindo-se
mais uns 4 quilômetros até a praia,
totalizando quase 100 quilômetros ida e volta. Eu só usava a bike para ir até
um sítio em Passagem de Pedra onde tinha um cavalo de nome Rockpile ( veja post
sobre ele aqui ) ou para ir até as Furnas explorar cavernas ( post sobre o
assunto aqui ), mas as distâncias comparadas com a dessa aventura eram nada, de
formas que foi uma doideira geral e hoje entendo porque não consegui ninguém
dos conhecidos por lá para me acompanharem. Talvez para atletas preparados que
andam pelas pistas em grupos e com apoio fosse apenas mais um treino, mas para
quem não tinha prática nem a bicicleta adequada para esses grandes
deslocamentos foi loucura... Ou uma grande aventura??
Após a gororoba matinal passei um protetor solar e calçado
com uma sandália de tiras e bermuda tipo surfista, com a identidade e uns
trocados no bolso, peguei estrada. Na bike levava uma garrafa com água no
suporte do quadro e uma camiseta enrolada no guidão. Cedinho, com a temperatura
ainda relativamente baixa, foi moleza, mais quando o Sol foi subindo no céu e a
temperatura foi esquentando a ficha caiu. As ladeiras foram aparecendo e também
as descidas para compensar. Os carros passavam tirando fino e alguns passageiros
ainda diziam piadas, mas, embora pudesse retornar sem muito estrago, a teimosia
e o orgulho me levavam para frente. Não me apressei em chegar, dei um ritmo nas
pedaladas que me poupasse energia, pois o tempo para mim não tinha a mínima
importância, o importante era concretizar a aventura. Depois de muita subida e
descida e o Sol já alto, comecei a ver as salinas, que são muitas nas
proximidades de Areia Branca. Isso me deu um alento, pois a garrafinha já
estava com volume reduzido apesar de tomar uns goles de vez em quando só
para molhar a boca. Quando cheguei à entrada para Baixa Grande suspirei
aliviado, como se tivesse chegado em casa. Mas o sofrimento estava só
começando. A bike no calçamento irregular era um martírio para o corpo que, já
estafado do esforço no asfalto da BR, chacoalhava mais que ônibus velho em
estrada de piçarra. No entanto, a vontade de chegar até a praia e tomar um
banho relaxante me fez continuar, afinal já estava sentindo o vento trazendo o
cheiro do mar, sem contar que a estrada tinha algumas comunidades e também
salinas com mangues mostrando muitos caranguejos pequenos e vermelhos na lama e
nos troncos das plantas. Enfim, na beira da praia. Maré seca e com águas calmas
relativamente frias, apesar de extremamente salgadas. Não é a toa que a região
é preferida para as salinas. O Sol já tinha passado do zênite ( ponto mais alto
no céu ), possivelmente já devia ser umas três horas ou próximo disso, era hora
de voltar. As pernas estavam bem pesadas como se quisessem ficar por ali mesmo,
e confesso que não eram só as pernas a se rebelar contra a volta, mas o corpo
todo. Antes que isso acontecesse reabasteci a garrafa da bike com água mineral
e peguei novamente a estrada. O início foi terrível, as pernas duras, o corpo
dolorido, mas a mente estava no comando... Ainda!
O ritmo agora mais lento e penoso, com a bike nas marchas
mais leves, mesmo porque ainda estava na estrada de calçamento irregular, me
fez chegar na BR já escurecendo. Ao olhar para a extensão a minha frente e lembrar
as subidas que teria que enfrentar, bateu aquele desânimo destruidor, mas, no
entanto, continuei o que naquele momento passou a ser uma penitência.
Durante a volta pedi arrego em vários trechos e algumas
subidas foram feitas empurrando a bike. A única luz que tinha era a das
estrelas, pois a noite era sem Lua. E eram as estrelas minhas únicas
companheiras naquela solidão, com o corpo já nas últimas, tentava enganá-lo
observando as constelações e estrelas mais brilhantes no céu. Os carros eram
poucos naquela hora, mas a preocupação era grande apesar dos olhos de gatos e
lanterna da bike. Certa hora passou uma caminhão de pequeno porte com algumas
pessoas na carroceria que, ao me ver, gritaram para tomar cuidado com o boitatá
e cachorros doidos. Naquele momento o único perigo que corria era minhas pernas
se recusarem a mexer, por isso às vezes dava uma parada colocando-as elevadas e
apoiadas no quadro, massageando um pouco. O único barulho que escutava era o
que eu próprio produzia, às vezes até as batidas do coração. Nem um grilo, nem
um caçote ( espécie de anfíbio ), nem sequer um pássaro noturno como coruja ou bacurau fazendo algum
som, em compensação a minha mente cantava alto uma cantiga muito poderosa – Tá
chegando, aguenta firme.
Por fim, comecei a avistar as luzes da cidade. O corpo todo
relaxou um pouco neste momento, pois não haveria mais subidas, agora a estrada
era plana, sem vento contrário e o descanso estava perto. Quando passei pelo
meu vizinho parei a bike e respirei aliviado, apesar das pernas estarem já me
desobedecendo. Ao contar de forma resumida a aventura, me chamou de doido e ao
mesmo tempo sortudo, pois poderia ter morrido atropelado ou ter a bike
roubada. Foi a primeira e última vez que fiz aventura com bike, prefiro as
caminhadas, são mais seguras e minhas pernas e seus músculos não se rebelam.
Ufa!!
A cara diz tudo. Maluco total! |
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