Na aventura anterior, apesar de
ter chegado até Barra de Tabatinga numa caminhada rápida, já que não é tão
distante assim, nada escrevi sobre a praia. Agora sim, uma aventura de que me
recordo bastante, que ocorreu no início da década de 90.
A aventura se inicia quando ainda
morava na Vila de Ponta Negra e, junto com alguns parceiros de surf, combinamos
ir para Tabatinga no sábado bem cedinho de ônibus. Na época havia apenas uma
viagem de ida pela manhã cedo e o retorno por volta das 15 horas, sem
possibilidades de se conseguir outro transporte. Talvez, com sorte, fosse
possível conseguir carona de alguém na estrada, mas como eram cinco na turma a
chance de algum carro parar era quase zero.
Partimos bem cedinho em busca das
grandes ondas de Tabatinga e, ainda cedo de manhã (9 horas?), já estávamos no
mar pegando paredes variando de quatro a cinco pés com boa formação e implorando
por pancadas. Foi assim a manhã toda com a maré já secando. Com ela já seca por
volta do meio dia, fizemos um pequeno intervalo para o lanche e caminhar um
pouco atrás de outros picos mais a frente, já que estávamos logo no início da
praia, antes da subida para o atual Mirante. No local onde colocamos nossas
mochilas e capas de pranchas tinha um costado (falésia?) que dava uma sombra
boa a partir do meio dia, o que possibilitou um descanso e até um cochilo para
alguns. Eu preferi voltar para o mar e aproveitar as ondas que continuavam
bombando e logo fui seguido pelos outros. O prazer de surfar ondas de qualidade
foi tão intenso que simplesmente, quando fomos cair na real, o Sol já estava se
pondo e estávamos presos à praia. Naquela época (outubro?) a praia estava
completamente deserta e as poucas casas de veraneio se encontravam fechadas,
mas não tinham muros ou cercas. À noite, depois de enganarmos o estômago com
bolachas, discutimos sobre dormir na praia ou numa das varandas das casas de
veraneio. Decidimos pela segunda opção e, após encontrarmos uma casa próxima ao
nosso pico por volta das 19 horas, fizemos nossas camas com as capas e nos
preparamos para dormir e acordar antes do Sol nascer para pegar o terral (vento
que sopra da terra para o mar). Antes do sono pegar, tinham as conversas sobre
as ondas surfadas durante o dia. Quem detonou, quem pegou a maior do dia e por
aí vai. Conversa de surfista é assim mesmo né?
A conversa já estava no fim com
alguns já dormindo, quando chegou dois carros repletos de gente, todos homens
de caras fechadas, “solicitando” nossa retirada, pois precisavam colocar os
carros e ocupar a casa deles. Sobrou para mim, como mais velho no grupo falar
com eles e explicar que tínhamos perdido o ônibus de volta e, por isso,
tínhamos nos abrigado por lá com receio de chuva. Pedi desculpas pela invasão e
perguntei se teria algum problema se ficássemos na varanda da vizinha. Como
eles não se posicionaram nem a favor nem contra, levamos nossos troços para a
vizinha, também fechada, e fizemos nossa dormida por lá. Ainda bem que foram
compreensíveis para nossa situação, pois viram que não havia cachaça, drogas ou
outras más intenções.
Claro que a dormida não foi
tranquila, eu mesmo fiquei praticamente acordado a noite toda pensando sobre a
roubada que ocorreu e, desse dia em diante, decidi que a época em que podia
dormir em varandas de casas fechadas na beira de praias tinha terminado.
Antes ainda de o Sol nascer, já
estávamos de volta ao nosso point, e dentro do mar, pegando altas ondas, lisas
e perfeitas, esquecendo tudo que tinha ocorrido na noite passada. No entanto, as
barrigas reclamavam alguma coisa e a solução foi buscarmos calá-las no
coqueiral que havia onde hoje existem o mirante e restaurantes, pois a grana
restante era suficiente apenas para pagar o ônibus. O único que sabia subir em
coqueiros era eu, então não perdi tempo e encontrei um com cachos suficientes
para fornecer água e alimento para todos. A dificuldade não foi para subir e
derrubar os cocos, mas sim para abri-los. Não foi fácil, mas conseguimos
batendo em pedras. Foi um banquete, pois a água era doce e o fruto (polpa) também.
De quebra ainda tínhamos o belo visual daquele marzão onde hoje se observam os
eventuais golfinhos. Apesar de não os termos vistos, só em poder observar as
séries entrando lisas e perfeitas já pagou o sofrimento para abrir os cocos. Saciamos
nossa fome e sede e ainda levamos uma grande quantidade para os que ficaram
reparando nossas coisas na praia. Foi o resto da manhã e início da tarde regado
a muito surf e coco. Era pegando onda e mastigando pedaços de polpa retirados
de dentro do bolso. Só faltaram uns pedaços de rapadura para o casamento
perfeito, mas aí era querer demais né?
No final, já dentro do ônibus
voltando para casa – claro que ninguém se desligou do horário da volta né? –, rimos bastante da roubada, mas apesar de tudo,
valeu muito a pena pelas ondas que surfamos durante o sábado e domingo. Além do
mais, as conversas com os parceiros que não foram para a trip perduraram
durante muito tempo, inclusive com aumentos, hehehe.
Fui outras vezes para Tabatinga,
de carro e de moto, inclusive para outros picos da praia muito bons como o que
fica já próximo do pontal da falésia, mas nenhuma outra caída teve a mesma
intensidade desta aventura, talvez pelas roubadas e pelo grupo que dela
participaram, quem sabe?
Não foi possível registrar com
fotos esta aventura, pois ninguém possuía câmera, mas abaixo se encontra
algumas imagens retiradas recentemente durante uma trip à praia com minha XLR
125, inclusive uma subindo em um coqueiro na praia de Zumbi para dar ideia da dificuldade,
e, também, uma imagem do Google Earth mostrando os locais descritos no texto.
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TABATINGA |
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